A ÚLTIMA GUARDA

Francisco Ribeiro dos Santos, 1º Sargento da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Estado do Acre, F. RIBEIRO, o “Velho Guarda”, ou simplesmente “Guardinha”, como ficou conhecido no lugar que escolheu para viver, a periferia, o lugar simples, humilde, cheio de “problemas” aos olhos da sociedade, mas o único cheio de sentimentos, valores e ensinamentos, o lugar do povo, a BAIXADA DA SOBRAL.

Filho de seringueiros, 10º filho de 14 irmãos, nascido no Seringal 13 de Maio, interior de Cruzeiro do Sul/AC, passou parte de sua infância inserido na realidade de nossa vasta e rica floresta acreana, reduto de diversas histórias e crenças, mas acima de tudo, abrigo de muitas famílias de seringueiros, migrantes desse nosso Brasil. Ali aprendeu valores únicos, os quais carregou até o ultimo de seus dias, sob a “vigilância” cerrada de seu Arcelino, nordestino trabalhador, rígido e com os conselhos e ensinamentos todos na sola de sua “cinta” ou na ponta da vara. Estatura baixa, pele escura, olhos esverdeados, fala mansa, riso fácil, sujeito simples, humilde, de uma bondade indescritível, de muitos AMIGOS, um bom irmão, ótimo companheiro/esposo, e EXCELENTE Pai e Avô, difícil achar quem dele não gostasse.

Amava a família, os amigos, e o TRABALHO, este que ingressou em 1982, seguindo a tradição da família de policiais militares, após dias difíceis em busca de um futuro melhor saindo de seu reduto maternal, andou por garimpos, por diversos quintais das casas de Rio Branco, onde fazia seus “bicos”, e como tudo desde o início de sua vida, LUTOU para seguir o que havia escolhido. E em meio as caminhadas pelas ruas da Baixada sem transporte público, alimentações precárias (mas valiosas) e muita ajuda da irmã querida, que sempre o auxiliava na compra e lavagem das fardas do curso de formação, logrou êxito e chegou ao seu objetivo, formou Soldado da Polícia Militar do Estado do Acre.

Ali iniciava a história do responsável, ético, compromissado, profissional e honrado Policial Militar, F. RIBEIRO, exemplo para muitos que estiveram sob seu comando ou não, dono de diversos elogios e condecorações, não por sua profissão, mas pelo emprego de seus valores no exercício dela, aqueles adquiridos desde os dias de seringal. Isso lhe era motivo de orgulho e honra, lembro-me do quão sem graça ficava quando o elogiavam em nossa frente, mas ao mesmo tempo via o brilho em seus olhos, aquele mesmo brilho que vi em minha formação acadêmica, e em todas minhas conquistas e de meus irmãos, o brilho de ORGULHO, de GRATIDÃO.

Hoje completam 30 dias desde sua partida, e como ela foi honrada e importante, sem recuar, sem cair e sem temer, sim, assim como declama o hino da luta de nossas terras acreanas, assim foi a sua. Foram 49 dias de batalha, dos quais 41 foram dentro de um a UTI, lutando bravamente contra a infecção e sequelas de um vírus INVISÍVEL e LETAL, que errônea e tão irresponsavelmente é RIDICULARIZADO e MENOSPREZADO pela sociedade, e pelo DESGOVERNO que as “guia”, é triste lembrar que seus últimos dias foram dentro do local que mais o amedrontava, mas estes foram enfrentados bravamente, por você e por nós que tanto lutamos para mantê-lo aqui, mas sabe de onde tiramos tanta força? De você, de sua luta ali dentro, se sua luta de vida até aqui, e te garanto, que lutaria até hoje se assim Deus tivesse permitido.

No início da internação de meu pai, ainda na enfermaria, entediado de ali estar volta e meia o pegava assobiando uma canção que não me era comum aos ouvidos, mas que tinha certeza já a ter ouvido, não o questionei sobre o que seria, mas hoje quando sentei para escrever e mexer em alguns pertences de sua vida policial, lembrei-me de onde era aquele som, era a Canção da Polícia Militar do Estado do Acre, esse era o assobio que o eterno GUARDIÃO DA ESTRELA ALTANEIRA soprava de seus pulmões debilitados e ferozmente atingidos pelo vírus, mostrando toda sua paixão e compromisso com essa corporação, a qual aqui estendo meus agradecimentos e toda gratidão de minha família, por durante mais de 38 anos terem sido também a família desse IMORTAL GUERREIRO que hoje permanece dentro de nossos corações, OBRIGADO!

Não podemos deixar de lembrar de todos os familiares e amigos que tanto ele prezava e amava, como vocês foram e tem sido essenciais em nossa batalha, sei que onde estiver ele está surpreso e feliz por saber o quanto fez amigos bons e fieis a ele, antes de todo esse processo não tinhamos noção do quão querido e amado meu pai era, isso me enche o coração de alegria e gratidão, pois como ele sempre me aconselhou: – Meu filho, saiba entrar e sair dos lugares, faça boas amizades e elas lhe serão fiéis, pois isso é a única coisa que levamos dessa terra. OBRIGADO!

E por fim, mas não menos importante, ouso dizer que foram os principais e essenciais neste momento, todos os Profissionais de Saúde e Equipe do Hospital Santa Juliana, pessoas e instituição colocada em nosso caminho por DEUS, vocês ressignificaram os conceitos das palavras CUIDADO e EMPATIA, me faltam meios para expressar o quão gratos fomos e somos durante todo esse processo, desde vocês, INÊS e JR, ótimos profissionais de zeladoria, queridas amizades que meu pai fez em 08 dias de internação da enfermaria, até todos enfermeiros, técnicos, médicos e administração em geral, obrigado por todo cuidado e carinho para com ele, e sim, meu pai teve o melhor tratamento que ele podia ter, não seremos tolos e arrogantes a ponto de diminuir ou menosprezar todos os cuidados médicos que ali não foi destinado sobremaneira a meu pai, pois foi O MELHOR disponível, e isso nos deu mais 49 dias com ele, com os olhares, gestos, piadas e ensinamentos dele, e nos preparou para o que estaria por vir. MUITO OBRIGADO!

E como se de forma a me preparar e coroar todo essa jornada, em minha última visita a UTI, última em que ele viu alguém acordado, me presenteou com mais uma afirmação do quão guerreiro seria, confirmando que enquanto tivesse forças lutaria, pois aqui era onde ele queria estar com as pessoas que amava, na vida que lhe foi dada e que de pouquinho em pouquinho ele transformou e deixou a sua maneira.

E assim ele descansou, e encerrou a sua ÚLTIMA GUARDA.

DENER A B dos SANTOS

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